Estava preocupado, muito preocupado. Não sabia o que fazer, e tudo por causa do raio da testemunha de Jeová.
Encontrara uma na rua, com quem perdera tempo suficiente para tentar perceber porque é que eles afinal são contra as transfusões de sangue. E até percebeu. Perdeu duas horas e o segredo da sua identidade mas já sabe onde aparece na Bíblia deles (que agora para si é a mais real e verdadeira) que “não deverás consumir o sangue”.
Realmente, isto mudava para sempre a sua relação com a namorada. Ia passar a evitá-la sempre que estivesse com o período. Mas isso agora não o incomodava.
A testemunha de Jeová, na conversa, ficara a saber o nome de Jorge. Depois seguiu-o até casa (provavelmente seguindo um pedido de Deus).
Dois dias depois, estava à porta do seu prédio para lhe dar uma revista como surpresa, e enganou-se na casa. Tocou para o vizinho da frente. Um anarquista agnóstico e extremamente cuidadoso.
Apenas disse abruptamente que não se chamava Jorge, mas sim Jaime, e assim que se apercebeu que era uma testemunha de Jeová ficou preocupadíssimo e ligou logo para o pai de Jorge.
“Vieram aí à procura do teu filho e de certeza que querem conquistar esta merda toda. Tu faz qualquer coisa. E pensava que tentavas afastar o teu filho de todas as religiões. Que é esta merda?”
“Vou já para aí. Obrigado.” – agradeceu o preocupado pai.
Jorge foi avisado de que o vizinho chamara o seu pai, e daí a sua preocupação. Ficou à entrada do prédio à espera que o pai chegasse de Espanha, e que rezava para que não lhe acontecesse nada, indo assim contra a sua educação agnóstica.
Barnabé, o pai, chegou numa carrinha. Nesse momento saiu o seu vizinho do prédio. Barnabé saiu do carro e começou logo a berrar.
“Foda-se, testemunhas de Jeová, agora sou visitado por testemunhas de Jeová, é?”
Enquanto falava dirigiu-se à mala do carro para a abrir, e mostrou o cadáver de uma “Jeovala”, como ele prefere chamá-las.
O vizinho fez um sorriso, mas sempre disse:
“Tens que ter calma, eles não acabam assim.”
O filho, assustado, ficou boquiaberto, e depois de pedir desculpa mais uma vez, disse: “Papá, se eu ficar constipado não vais poder matar todos os micróbios do mundo. E por teres despachado uma Jeovala, como tu costumas dizer, eles vão continuar a andar por aí…”
Barnabé ficou furioso, tirou da mala um saco de víveres, uma bazooka e uma faca do mato. Depois de fechar, trancar e verificar que estava trancado, começou a andar para a entrada do prédio, e apenas afirmou:
"Vocês não conhecem o meu modo operacional. A partir de agora não quero ouvir nem mais uma palavra. Quem falar é considerado Jeovalo e é abatido.”
A partir daí viveram seguros, nunca sendo afectados pelas explosões que vitimizavam as testemunhas de Jeová. No entanto Jorge continuava preocupado.
Apanhara, anos e anos antes, o tique de dizer “Jesus!” depois de espirrar e não o conseguia evitar. O pai já lhe tinha batido por causa do assunto, mas antes do assunto da testemunha de Jeová. Jorge tinha medo, com o Inverno a aparecer, de espirrar, não conseguir evitar o seu tique irritante e assim perdeu a vida. Logo no dia 25 de Dezembro tinha que lhe sair a palavra proibida da boca.
Há azares inexplicáveis.
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