Estou farto desta merda. Há três anos e tal a lixar-me o juízo com tudo e mais alguma coisa... Mas é agora, chegou "o tempo do adeus", como cantava a outra. Estou aqui parado a olhar para a porta e não consigo entrar. Nervoso, daqui a nada dá-me vontade de mijar... Foda-se, é agora.
"Olá amor, tudo bem?"
Nem penses que te vou beijar, tou farto de ti.
"Tou à rasca para mijar, já venho."
Acho que já não olhava para o meu caralho nesta casa feliz há muito tempo. Mija, mija, e depois foge.
Depois baixa TU a tampa da sanita, desta vez já não te safas...
"Estavas com uma voz estranha ao telefone, passa-se alguma coisa?"
"É pá, sim, temos que falar. Senta-te."
Eu é que não te apanho do chão de certeza e não, não me vou sentar ao pé desse teu cu gordo.
"O que é?"
"Senta-te."
Roubo-lhe um cigarro e lá vai disto.
"Susana, nem sei bem como começar, mas eu já não aguento mais..."
"O quê? estás a acabar comigo assim, do nada?"
"Não é do nada, e tu sabes. As coisas já me estão a matar por dentro quase desde o início."
"Não digas isso, eu sou a tua coisinha... Estou sempre à tua espera, faço tudo por ti, e faço tudo para ti..."
A coisinha, a coisinha, mais a puta da coisinha. Foda-se, mas porque é que as gajas se põem a meter "inhas" em toda a puta de nome que aparece?
"É pá, eu se calhar quero mais qualquer coisa..."
Calou-se, será que vou ter sorte? Ui, agora a chorar... Não lhe posso deixar começar com choraminguices e a pedir lenços e o caralho.
"Aliás, nem sequer se trata de querer mais qualquer coisa. Quero dizer, por acaso quero, mas não é só isso. Acima de tudo, aquilo que dizes que fazes por mim e para mim só me fode a cabeça."
"O quê?"
"Tu sabes perfeitamente, não me venhas com merdas. Entre outras coisas, se vou beber café com a Joana, que por acaso até conheço há mais de 10 anos, passas a vida a ligar-me. Com a Mafalda, apareces no jardim e fazes um ar de surpresa que é ridículo. Tu não és minha dona, foda-se..."
"Tu já não gostas de mim..."
"Ena! Foda-se, pois não... E não é por causa das minhas amigas. Nem por causa das gajas boas da televisão. Nem por causa do decote da mamalhuda do café... És tu! Tu não me deixas fazer nada descansado. Aliás, tu não me deixas fazer nada. Tens que aparecer lá sempre, sempre, sempre, sempre. Não me deixas ter vida nenhuma. E agora choras..."
Foda-se, ela a chorar daqui a nada está a saltar-me para cima... E nunca é a última queca...
"Ó amor... Ó amor, eu mudo, eu faço tudo."
"Foda-se, tu já fazes tudo. Quase que não posso sair de casa com as calças rotas. Queres ver se caguei bem, se o bife me caiu bem?"
"Eu deixo de te ligar tanto, vai sair com os teus amigos. Não era o João que fazia anos hoje?"
"Sim, Eu vou sair com os meus amigos. E tu não. E não me ligues para dar os parabéns ao João, liga para ele."
Gosto tanto de ser teatral, de tirar a caneta prontíssima do bolso da camisa.
"Tens um papel?"
Não fiques parva a olhar para mim, agora começa o deboche...
"Não? então escrevo na tua mão..."
Já nem olhas para mim, ainda bem. Caneta heróica, volta lá para o bolso. Então e agora agarra-se?
"Larga a minha mão, vou-me embora."
"Não vás, não vás. Dá-me cinco minutos, isto não pode ser assim. Eu tenho... Eu não te posso deixar ir assim. Eu tenho que falar, espera..."
"Tens dois minutos."
"Ó amor..."
"E já está a contar..."
Lindo, a chorar mais. Estou a ganhar tempo sem palavras...
"Amor..."
É tão bom ouvir esta música... "Amor................. amor........ amor......... paixão......... amor............. ciúmes............ eu mudo, eu mudo......... amor......"
"Bem, já tiveste os teus dois minutos. Adeuzinho."
"Não tens uma palavra para mim? Uma única palavra?"
"Nem por isso, preciso de apanhar ar."
"Foda-se, uma única palavra. Não és capaz de me dizer nada?"
Hoje está um belo dia de sol. Merece uma saída triunfante. O meu pai falou-me da batalha dele lá em Moçambique contra 300 pretos em que 50 gajos fizeram um milagre. Daqui a uns anos, hei-de ter um filho humorista e tenho que me lembrar desta, já não me lembrava desta há uns tempos.
"Sim, tenho uma palavra para ti."
Maravilha, parou de chorar. Cofio o meu bigode triunfante, e só lhe digo:
"Torresmos"
Acabou-se. Só espero que o elevador ainda cá esteja. Ela começou a chorar outra vez, só tenho p'r'aí 10 segundos...
E pronto. Acabou-se.
Já abri a porta, agora tenho mesmo um admirável mundo novo aqui à frente.
Pronto, é simples. Previsível. Chora, chora e pronto. E eu fico calminho, tranquilo. Nem sequer fico a pensar na próxima. Foda-se, nem sequer quero pensar em próxima, agora... Se me sai outra chanfrada destas...
Não custa nada. Vai lá. Abre a puta da porta. Ela está à tua espera. E tu até tens uma saída triunfal e tudo. Tu consegues. Tu consegues... Sai da vida dela. Sai dela. Foda-se, abre a porta, vai mijar. Prepara-te para berrar "Torresmos", cospe para o chão se te apetecer e foge. Foge para longe. Foge para ti.
1 comentário:
gostei imenso do texto. senti-o completamente. quer do lado dele, quer do lado dela. intensíssimo.
Enviar um comentário